Fim de isenção impacta preços e tira competitividade de sites asiáticos

(Invest News)
por Taís Laporta

Opinião é de especialistas consultados pelo InvestNews; benefício para varejistas nacionais, no entanto, é incerto e não imediato.

fim da isenção de imposto para envios internacionais de produtos abaixo de US$ 50 (cerca de R$ 250 hoje) deve reduzir a competitividade e elevar os preços no Brasil de plataformas de varejo asiáticas como Shein, Shopee e AliExpress, do grupo Alibaba. No entanto, segundo especialistas ouvidos pelo InvestNews, a contrapartida – que seria o benefício para varejistas nacionais – ainda é incerta e não deve ser imediata.

Confirmada nesta quarta-feira (12), a medida não chegou a surpreender, uma vez que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já vinha afirmando que cogitava alternativas para aumentar a arrecadação de impostos – e uma das possibilidades seria taxar as varejistas internacionais de comércio eletrônico.

Shein, Shopee e AliExpress

Até então, era cobrado um tributo de 60% sobre o valor de encomendas internacionais, com exceção das compras entre pessoas físicas (encomendas pessoais), que tinham isenção de até US$ 50. No entanto, a Receita Federal e varejistas brasileiros argumentavam que esse benefício vinha sendo amplamente utilizado de forma fraudulenta para vendas realizadas por empresas estrangeiras.

Ao InvestNews, a Shopee afirmou por nota que “as possíveis mudanças tributárias em compras internacionais não afetarão os consumidores Shopee” e que “apoia o governo em qualquer mudança tributária”.

“Mais de 85% das vendas da Shopee são de vendedores brasileiros e não de fora do país. A Shopee está no Brasil desde 2019, tem dois escritórios na cidade de São Paulo e emprega mais de 3 mil colaboradores diretos. Além disso, a taxação que está sendo discutida vale para compras internacionais de forma geral e não apenas para plataformas asiáticas. Temos origem em Singapura, mas nosso foco é local”, afirmou em comunicado.

Procurada, a plataforma AliExpress afirmou que acredita que “possíveis atualizações regulatórias serão feitas com total consideração com o objetivo de aumentar os benefícios de escolha e valor para os consumidores brasileiros”.

Importação por pessoa física cresceu quase 40% em 2022

O volume de remessas postais do exterior pro Brasil disparou 39,44% entre 2021 e 2022, passando a cerca de 176 milhões. Essa modalidade é usada principalmente por pessoas físicas no comércio eletrônico, buscando um canal de baixo custo.

Enquanto isso, o volume de remessas expressas, aquelas usadas por empresas para importar produtos ao Brasil, caiu 9,49% em 2022, segundo a Receita Federal.

Impacto para plataformas asiáticas

O consultor e fundador da Varese Retail, Alberto Serrentino, acredita que, embora as plataformas asiáticas devam perder parte do apelo e competitividade de preços após a medida, elas provavelmente manterão um negócio relevante no país.

Para ele, pode até haver uma queda no volume de vendas cross border (comércio entre fronteiras) no Brasil, mas ele deve continuar atrativo, uma vez que, segundo o especialista, “as plataformas internacionais têm uma grande capacidade de fazer chegar produtos que às vezes não se encontram aqui, numa velocidade enorme”.

“Não acredito que [o fim da isenção] vá matar o fenômeno do cross border, porque ele faz chegar produtos que não se encontram no Brasil e que, às vezes, mesmo tributados, ainda assim são competitivos”.

ALBERTO SERRENTINO

Para o professor e especialista em logística e varejo Eduardo Marostica, a medida deve trazer um impacto direto para as varejistas internacionais num primeiro momento e um fortalecimento do mercado local, além de um impacto indireto no médio prazo para os competidores de fora, com um perda significativa de market share.

“Há que se adaptar, porque faz parte de um regra e todos devem seguir. (…) Faz parte de uma normatização em todo e qualquer mercado”, observa Marostica.

Benefício para o varejo nacional é incerto

O especialista em gestão de varejo Luiz Claudio D. acredita que, em um primeiro momento, produtos mais caros vendidos por varejistas internacionais não devem refletir em uma migração das compras do consumidor para o mercado nacional. “Essa regra não é imediata, porque alguns produtos não são substituíveis no mercado nacional”.

Segundo ele, outros fatores poderiam reduzir o impacto da medida, como parte da taxação ser compensada por possíveis subsídios governamentais dados a fornecedores da China, por exemplo. “Essa quantidade de dinheiro automaticamente voltaria para o mercado interno. É quase impossível estimar”, diz.

Outro impacto possível da medida, segundo Luiz Claudio D., seria sobre uma rede de pequenos vendedores (micro sellers) conectados aos marketplaces dessas plataformas no Brasil, com potencial de mexer com essa rede de distribuição local.

Para Gabriel Costa, analista da Toro investimentos, a medida visa equilibrar a concorrência, visto que os produtos comercializados pela Shein, Shopee e Aliexpress apresentam valores mais baixos do que produtos do mercado nacional e não estão sujeitos à tributação. Isso tem levado à perda de market share das varejistas locais, especialmente no varejo de moda e eletrônicos, para as empresas asiáticas.

Segundo o analista, a medida também busca combater a sonegação fiscal, uma vez que alguns vendedores têm utilizado práticas como o subfaturamento ou a divisão de remessas para driblar a tributação.

Efeitos para a economia

Marostica avalia que a proteção anunciada pelo governo é devida, visto que ela pretende proteger empresas que produzem e operam no mercado nacional e que, em sua visão, acabam sofrendo uma competição desigual.

“Nota-se que grandes varejistas de e-commerce asiáticos usam muitas vezes regras duvidosas, para não dizer leoninas, uma vez que muitas mercadorias acabam ingressando no mercado nacional sem a devida tributação”.

EDUARDO MAROSTICA

Ainda segundo o especialista, a medida é uma regra protecionista já observada em mercados internacionais como o norte-americano. “Visa fortalecer o nível de receita da operação local e privilegiar aqueles que operam dentro do regime tributário mais adequado”, complementa.

Para Serrentino, a regra que isenta as encomendas pessoais de até US$ 50 abriu um “limbo regulatório”. Segundo ele nunca foi uma isenção explícita para empresas e consumidores, mas contribuiu para uma brecha que fez explodir o cross border no Brasil, fazendo com que operações entre empresas e consumidores acontecessem pela modalidade de encomenda pessoal.

A mudança me parece muito correta no sentido de dar tratamento isonômico à competição das empresas brasileiras em relação às internacionais”, diz Serrentino.

Luiz Claudio D. acrescenta que não se pode afirmar que a indústria nacional será beneficiada, pois acredita que como o setor de varejo vem sofrendo há anos, especialmente na produção nacional que foi reduzida na indústria textil, a absorção dessa mudança não seria rápida.

“É mais uma ação, não só do governo atual mas dos demais, que trata a questão da reforma tributária com ações pontuais. A carga tributária está batendo mais de 35% de tudo o que é composto o preço final do produto. Agir de forma pontual não resolve o problema”

LUIZ CLAUDIO D.

Já o analista da Toro acredita que a arrecadação federal deve ser aumentada, uma vez que está diretamente ligada às despesas do governo, de acordo com o recente arcabouço fiscal. “Como resultado, espera-se que os produtos das varejistas asiáticas percam atratividade, uma vez que os preços praticados no Brasil podem ficar mais próximos dos valores cobrados pelos concorrentes locais.”

Fonte: Invest News
https://investnews.com.br/negocios/fim-isencao-compras-exterior-entenda/

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