Farm: os bastidores da expansão internacional de quase R$ 100 milhões

(LinkedIn News)
por Letícia Toledo

Em 19 novembro de 2020, em meio a dezenas de casacos pretos e cinzas, a atriz Sarah Jessica Parker, apareceu nas ruas do distrito de Seaport, em Nova York, com uma jaqueta estampada com araras…

Em 19 novembro de 2020, em meio a dezenas de casacos pretos e cinzas, a atriz Sarah Jessica Parker, apareceu nas ruas do distrito de Seaport, em Nova York, com uma jaqueta estampada com araras, macacos e folhas em diferentes tons de azul, amarelo, rosa e verde. O look da estrela da série Sex and The City vinha acompanhado por um scarpin rosa pink e rapidamente foi parar em diferentes sites de moda. Para Parker, conhecida e admirada por seu estilo fashionista nada discreto, aquilo não passou de uma rotineira quinta-feira. Mas foi um acontecimento e tanto para uma empresa brasileira: a criadora da jaqueta desfilada por Jessica, a marca carioca Farm.

“De uma hora para a outra, celebridades americanas começaram a usar a nossa marca. As vendas no e-commerce dispararam e, depois, as lojas de departamento vieram nos procurar”, conta Marcello Bastos, cofundador da FARM Rio, em entrevista ao LinkedIn Notícias. Além de Parker, uma centena de celebridades — como as atrizes Jessica Alba, Ana de Armas e a cantora Taylor Swift — desfilaram pelas ruas e apareceram em vídeos usando peças da marca carioca durante 2020.

O fenômeno aconteceu em um momento crucial para a empresa. Após investir quase R$ 100 milhões em dois anos em seu plano de internacionalização, a pandemia tinha obrigado a Farm a demitir grande parte de seu time internacional, devolver o escritório e o showroom e terceirizar seu centro de distribuição nos EUA. O que parecia o início do fim da tentativa de mais uma empresa brasileira de se internacionalizar, de repente, começou a se transformar no primeiro caso bem-sucedido de uma marca de roupas daqui em outros solos.

Em 2022, a Farm Global, que reúne as operações da marca fora do país, atingiu um faturamento de R$ 490,4 milhões, alta de 80,7% na comparação anual. A previsão é de que até 2026 a receita da empresa no exterior ultrapasse a da operação da Farm no Brasil, que em 2022 foi de quase R$ 1,2 bilhão.

Como e quando ser global

Criada em 1997 na Babilônia Feira Hype por Bastos e Kátia Barros, a Farm teve seu primeiro contato com o mercado internacional em 2005. Na época, recebeu um convite para estar na grandiosa Galeries Lafayette, em Paris, junto com outras 17 marcas brasileira. “Nossa participação foi um sucesso! Começou a ‘chover gente’ pedindo para levar a nossa marca para fora, mas não tínhamos estrutura. Estávamos iniciando a expansão no Brasil”, recorda Bastos. Na época, a Farm tinha apenas uma loja fora do Rio de Janeiro.

Em 2010, Bastos e Katia se uniriam à marca Animale, dando início ao que é hoje o maior grupo de moda do Brasil, o Grupo Soma. Animados com a nova estrutura, os sócios pediram estudos para avaliar uma expansão internacional. “Na época, chegamos à conclusão que ganharíamos muito pouco dinheiro com as vendas internacionais naquela época e a gente não queria fazer um projeto grandioso como esse só pelo ‘branding’”, conta Bastos.

Ele e a equipe só voltariam a fazer as contas sobre uma expansão internacional em 2018, após ter sucesso com a venda de alguns produtos no e-commerce americano Anthropologie. “Nossas peças viraram as mais vendidas do site. Percebemos que tínhamos uma oportunidade”, afirma o executivo.

Ao se debruçar sobre o que era preciso para levar a marca para o exterior, uma das primeiras constatações que fizeram foi a de que os tecidos leves e alguns dos cortes das roupas não combinavam com o clima do hemisfério norte. Seria preciso criar coleções do zero para um inverno rigoroso e para temperaturas amenas.

“Um dos pontos que costuma atrapalhar os planos de internacionalização das empresas brasileiras é o fato de não termos cultura, matéria-prima e, normalmente, capacidade de desenvolver uma coleção de inverno”, explica Alberto Serrentino, da consultoria Varese Retail.

Na Farm, para resolver esse problema, Kátia Barros, que sempre foi a diretora criativa da marca, foi para o exterior estudar e criar novas coleções e a empresa passou a produzir em países como Marrocos, Turquia, Portugual e China. “Só os biquínis saem hoje do brasil”, diz Bastos.

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Coleção de roupas de esqui feitas pela Farm (Divulgação/Farm)

A empresa também entendeu que precisaria adaptar seus preços. Se vendesse na mesma faixa do Brasil, cerca de R$ 390, teria que competir com famosas como H&M e Zara. A saída foi subir os valores, para a média de R$ 1.250.

“Muitas marcas cometem o erro de trabalhar a internacionalização como apenas uma expansão, sem considerar que é preciso construir uma nova identidade, entender profundamente a cultura local e a partir daí adaptar como vender seus produtos e serviços”, destaca Mariana Cerone, professora de varejo da ESPM.

Essas adaptações foram fundamentais para garantir à Farm um destaque em luxuosas lojas de departamento dos Estados Unidos como Saks Fifth Avenue, Nordstrom e Bloomingdale’s. “Estar nas lojas de departamento premium posiciona a marca ‘para cima’, permite volume, dá visibilidade e alcança formadores de opinião. Não tem como uma marca premium se internacionalizar sem essas redes”, afirma o consultor Alberto Serrentino.

A expansão via lojas de departamento permitiu à Farm equilibrar as contas e não precisar mais dos investimentos do Brasil, que ultrapassaram R$ 85 milhões. “Chegou uma época em 2019, quando a gente tinha gastado R$ 80 milhões, que quase todos os nossos diretores eram contra continuar a expansão. Estava custando muito caro. Hoje, todo investimento e crescimento no exterior vem da própria Farm Global. A operação se paga”, comenta Bastos.

O grosso do faturamento da Farm Global vem hoje do e-commerce e das lojas de departamento e isso não deve mudar tão cedo. “Operar uma loja nos Estados Unidos é muito diferente. O autoatendimento precisa ser forte porque a mão de obra especializada é cara. Se for ter muitas atendentes, como fazemos no Brasil, a conta não fecha”, explica Bastos. Atualmente, a Farm possui três lojas próprias nos Estados Unidos e se preparar para estrear uma quarta em Los Angeles.

No ano passado, a marca também começou a fazer sua expansão pela Europa. Em abril de 2022, estreou uma pop-up store (loja temporária) dentro da Le Bon Marché, em Paris. Agora, vai abrir sua primeira loja em Londres e expandir sua operação na Itália por meio da loja de departamentos La Rinascente. Entre as novidades na Europa também está uma collab com a francesa Sézane, com estampas que mesclam ambas as culturas, como croissants e pastéis. “Ao todo, estamos tocando 29 projetos internacionais”, afirma Bastos.

Questionado sobre qual a possibilidade de uma marca brasileira se internacionalizar sem um caixa tão robusto quanto o do Grupo Soma, Bastos é categórico: “sem chance”. Ele também reconhece que a Farm contou com a sorte em sua expansão, ao cair no gosto das celebridades. “O cavalo selado passou na nossa frente e a gente aproveitou”, define. Agora, a Farm está estruturada o suficiente para não depender mais da sorte, mas um de seus grandes desafios no hemisfério norte será não deixar suas estampas saírem de moda. Seus 26 anos de experiência no Brasil devem ajudar.

Fonte: LinkedIn News
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