Por que Centauro e Magazine Luiza disputam a combalida Netshoes

(Exame)

Por Taís Laporta e Denyse Godoy

Oferta 40% maior da varejista de artigos esportivos divide opiniões quanto a sua capacidade de reerguer os negócios da concorrente.

 

Vale a pena tanto esforço – e dinheiro – pela Netshoes? Num momento em que a compra do combalido e-commerce esportivo pela varejista Magazine Luiza era dada como certa, um interessado de peso colocou em xeque o futuro da operação. O grupo SBF, dono da varejista de artigos esportivos Centauro, entrou na disputa ao ofertar 87 milhões de dólares pela Netshoes – um prêmio 40% maior que a proposta concorrente.

A notícia, até aqui, fez mais bem à Netshoes que a suas possíveis controladores. O anúncio desta quinta-feira fez os papéis da Netshoes chegarem a subir 40% na bolsa de Nova York, enquanto a Centauro também avançou na B3. Na contramão, as ações do Magazine Luiza perderam valor.

Mas de onde vem o interesse em uma companhia que despencou de valor desde que abriu capital na bolsa de Nova York, em 2017, acumula prejuízos e luta contra sua ruína financeira?

Da parte da Magazine Luíza, o ganho viria com um reforço na venda de vestuário e fortaleceria sua posição de mercado no segmento esportivo. A Centauro, por sua vez, poderia acelerar sua transformação digital, já iniciada nos últimos anos. A companhia já permite, por exemplo, que os clientes retirem na loja mais próxima artigos comprados online, e tem até um sistema de leilão entre as unidades físicas para estimulá-las a disputar o cliente online.

 

 

Quem tem fôlego para investir pesado?

A Centauro deixou claro que usaria os recursos de seu IPO para reduzir o elevado endividamento. Com isso, precisará fazer um financiamento bancário, que já está pré-aprovado, para adquirir a concorrente.

Um gestor que comprou ações da Centauro na estreia da Bolsa diz que pretende vender o papel, apostando que uma oferta tão alta não foi acertada. “Para quê a Centauro vai gastar tanto dinheiro na compra de uma empresa quebrada?”, questionou.

A Netshoes vai precisar de investimentos pesados, tendo em vista que está à beira de pedir recuperação judicial. Necessita, portanto, de um parceiro financeiro forte, capaz de fazer os aportes para recuperar a operação. Enquanto a Centauro não tem caixa para isso, o Magazine Luiza pode dispor de 2 bilhões de reais.

Ainda que tenha feito uma proposta melhor, a Centauro teria chances pequenas de bater o Magazine Luiza na hipótese de as duas empresas iniciarem um leilão.

No entanto, um empresário do setor avalia que a oferta da Centauro foi uma estratégia inteligente, por abarcar duas frentes: ela tira do jogo um potencial rival no segmento esportivo e, ao mesmo tempo, pode unir as operações das lojas físicas com o que a Netshoes tem de melhor, seu e-commerce.

Mesmo que o Magazine Luíza melhore sua oferta, o negócio com a Centauro continuaria mais interessante do ponto de vista operacional. “Eles [Magazine Luiza] nunca terão a mesma profundidade de estoque, expertise, prazos de pagamento e as ações de marketing que a Centauro”, defende o empresário.

Outro diferencial seria a preferência das marcas esportivas pelo branding na Centauro. “Adidas e Nike certamente vão preferir ofertar um tênis de R$ 800 ao lado de outros calçados do que junto de um fogão ou um liquidificador”, diz.

 

 

Um salto em sinergia e market share

O fundador da consultoria Varese Retail, Alberto Serrentino, vê a oferta da Centauro como um movimento defensivo. Seria a grande chance de ver seu market share disparar e, ainda, evitar o crescimento de um concorrente de peso. “É uma estratégia justificável e até incompreensível que não tenham feito a proposta antes”, defende o consultor. “Não é só uma questão de quanto custa comprar, mas também de quanto custa não comprar”.

Ruy Hungria, especialista em ações da publicadora de conteúdo Empiricus, enxerga uma sinergia clara entre as duas empresas, mas pondera que o passo pode ser grande demais para a Centauro no momento.

A Netshoes vendeu 1,8 bilhão de dólares em 2018, no mesmo patamar de 2017. Mas teve resultado operacional muito pior, com margem Ebitda de menos 11,3%, ante menos 1,2% em 2017. O prejuízo quase dobrou, de 170 milhões para 332 milhões de reais.

A Centauro, por sua vez, faturou 2,2 bilhões de reais em 2018, ante 1,9 bi em 2017. O lucro somou 149 milhões de reais, numa queda de 38% sobre 2017.

“A Netshoes tem as suas próprias dificuldades, e não vai ser possível incorporá-la imediata e suavemente à Centauro. Para os acionistas, acho que essa oferta é um alerta. A Centauro está querendo entrar em um um novo processo de endividamento que já viu que não dá certo”, diz Hungria. Em 2017, a Centauro precisou reestruturar sua dívida que cehou a 373 milhões de reais com Itaú, Bradesco e Banco do Brasil.

 

 

Luta para sair do buraco

Para tentar melhorar sua situação financeira, a Netshoes vem desmobilizando parte de seus ativos e renegociando dívidas. No ano passado, vendeu seus negócios no México e descontinuou seu negócio B2B, de transações entre clientes corporativos.

A empresa também anunciou, em abril, a venda de sua operação na Argentina para o grupo de investimentos BT8.

O anúncio de que a Netshoes buscava um comprador foi feito em agosto do ano passado. Desde então, a empresa estava trabalhando com o banco de investimentos Goldman Sachs para buscar um novo sócio capaz de injetar capital na companhia. Um leilão para compra-la seria uma boa notícia após dois anos de sofrimento.

Em 2017, a empresa abriu capital com seus papeis valendo 16 dólares; agora, mesmo com a alta de 40% desta quinta-feira, a ação segue abaixo dos três dólares.

 

Fonte: Exame
https://exame.abril.com.br/mercados/por-que-centauro-e-magazine-luiza-disputam-a-combalida-netshoes/
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